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Mercado de ações e tragédias humanas e ambientais: como os investidores reagem aos desastres da Vale

Victor Barboza


Acabamos de rever uma tragédia que ninguém gostaria de rever. Após o ocorrido em novembro de 2015, envolvendo a barragem de Fundão, no município de Mariana, em Minas Gerais, a empresa brasileira Vale S.A acaba de ocasionar um crime parecido, agora na cidade de Brumadinho, também em Minas Gerais. Nas duas tragédias, o rompimento de barreiras causou a invasão de um mar de lama, causando destruição de casas, mortes de pessoas e animais, traumas incontornáveis para os envolvidos e um estrago ambiental imensurável.



Apesar do primeiro desastre em Mariana, ironicamente, de lá para cá as ações da Vale acumularam alta na Bolsa de valores brasileira, a B3, de acordo com reportagem do Valor Econômico do último dia 25. Mais precisamente, 258% de alta. Na época do desastre de 2015, as ações se desvalorizaram, chegando até um valor mínimo de R$ 7,97. No pregão do último dia 24, no entanto, a cotação chegou em R$56,15! Vale destacar também que as ações da Vale são uma das que mais têm peso no Ibovespa, principal índice do mercado de ações brasileiro. As ações da Vale representam 10,903% da atual carteira. É a terceira maior empresa brasileira de capital aberto, ficando atrás apenas do Itaú Unibanco e do Banco Bradesco.



Na época do desastre de Mariana, em 2015, as ações se desvalorizaram, chegando até um valor mínimo de R$ 7,97. No pregão do último dia 24, no entanto, a cotação chegou em R$56,15.


Um sonho de muita gente é ser sócio de grandes empresas. Esse sonho pode se tornar realidade graças ao mercado de ações, cada vez mais democratizado no universo digital. Porém, identificar empresas com os mesmos valores que os nossos é um passo muito importante na hora de escolher em quais ações. Com base nisso, o caso da Vale é um que merece ser analisado de perto.



Um pouco sobre a Vale


A Vale, antiga Companhia Vale do Rio Doce, é uma empresa mineradora multinacional brasileira, além de ser uma das maiores operadoras de logística do país. Inicialmente todas as reservas de minério de ferro de Minas Gerais eram dos ingleses (compra efetuada em 1909), formando uma empresa de capital inglês. Foi em 1942, no governo de Getúlio Vargas, que a empresa foi encampada, formando a Companhia Vale do Rio Doce (CVRD).



A empresa surgiu após um acordo entre Estados Unidos, Inglaterra e Brasil, durante a Segunda Guerra Mundial. Os ingleses e os norte-americanos precisavam do fornecimento de minério de ferro para as indústrias. A empresa foi, ainda, fundamental para a reconstrução do Japão depois da guerra. O crescimento deste país foi um dos principais fatores para tornar a Vale uma grande mineradora.



No período entre 1969 e 1979 a empresa tornou-se a maior exportadora de minério de ferro do mundo, e mantém este posto até hoje. Em 1997 a empresa foi privatizada e comprada por um consórcio liderado pela Companhia Siderúrgica Nacional.



De lá para cá, várias marcas importantes foram atingidas, batendo recordes de lucros e, em 2003, superando a marca de US$ 100 bilhões.



Apesar do crescimento vertiginoso da empresa, desde os momentos da privatização algumas polêmicas começaram a surgir. A Vale teve seu preço de venda em US$ 3,338 bilhões, subestimado de propósito para garantir lucro aos empresários privados. A companhia também apareceu com denúncias em esquemas de corrupção dentro e fora do país.



Porém, os maiores problemas foram justamente os rompimentos das barragens, que aconteceram num período curtíssimo, e causaram estragos imensuráveis e irreparáveis para comunidades e para o ecossistema. Também devemos lembrar que o crime de Mariana segue impune ainda hoje. O processo, que envolve executivos da Samarco, além da Vale e da BHP Billiton (que controlam a mineradora) tramita na Vara Federal de Ponte Nova-MG, ainda sem data para julgamento. Das 68 multas aplicadas por órgãos ambientais, apenas uma está sendo paga – e em 59 parcelas. As famílias prejudicadas ainda não receberam nenhuma indenização pelos danos, mortes e horror sofridos.



Estratégias para investir no mercado de ações


A Vale é uma das empresas que possibilita que o investidor se torne sócio. Isso é possível devido ao seu capital aberto, podendo ser comprado através de ações da companhia.



Uma empresa abre seu capital na bolsa de valores para captação de recursos, focando em investimentos. Basicamente, a empresa vende cotas do negócio, para, em troca, ter os recursos para tais investimentos. Uma vez que os primeiros investidores compram ações na Oferta Primária Inicial, o IPO, estes recursos vão diretamente para a empresa.



Já as vendas posteriores das ações, que caracterizam o mercado secundário, são feitas entre investidores. Isso não representa mais recursos indo para a empresa em si.



Não é qualquer empresa que consegue abrir seu capital nas bolsas de valores. Para isso, há uma série de requisitos de Governança Corporativa que devem ser cumpridos. Em outras palavras, a empresa deve obedecer a um conjunto de processos, costumes, políticas, leis, regulamentos e instituições que regulam como a empresa é dirigida.



Quando pensamos no mercado de ações, existem duas grandes estratégias para se investir. A primeira delas é baseada na Análise Fundamentalista. Como o próprio nome já diz, ela se baseia nos fundamentos das empresas, ou seja, na análise dos resultados, do segmento e, finalmente, nos valores da empresa. É uma estratégia mais focada no longo prazo e que tem como grande pergunta “Você seria sócio da empresa?”. Se a resposta for sim, pode ir fundo e investir.



A segunda estratégia é baseada na Análise Técnica. Aqui o foco é olhar os gráficos e tendências. É uma análise muito mais especulativa e mais direcionada para o curto prazo. É bem mais “crua”, pensando em números e gráficos, e não olha para os valores da empresa ou para situações pelas quais a própria é responsável (ou seja, não se trata de um acidente ou algo imprevisível ou inevitável), como as de Mariana e Brumadinho.



A Análise Fundamentalista se baseia nos fundamentos e valores da empresa, direcionada para longo prazo; já a Análise Técnica foca nos gráficos e tendências, é mais especulativa e direcionada para o curto prazo.


A alta substancial das ações da Vale desde 2015 mostram a ferocidade de muitos investidores do mercado ao montar sua estratégia em cima da Análise Técnica. Se uma empresa consistente no mercado tem uma queda brusca, muitos investidores aplicarão em peso porque sabem que essas ações irão subir em algum momento. Não importa o que tenha acontecido. (É claro que isso às vezes pode causar certa dor na consciência, como a do investidor que pretende doar os lucros para as famílias de Brumadinho.)



Você seria sócio(a) da Vale?


Nosso foco aqui é em relação à Análise Fundamentalista – ou seja, responder à pergunta: “Você seria sócio(a) da Vale?”. Além dos resultados financeiros, conforme já dito, considero de fundamental importância observar os princípios e valores da empresa em que você está passando a fazer parte. Vale uma reflexão se você se sente orgulhoso(a) por ser um “proprietário” da empresa que você está comprando ações. Pense, além da área em que atua e da sua rentabilidade, o que esta empresa tem feito para a sociedade e para o ecossistema.



Vale uma reflexão se você se sente orgulhoso(a) por ser um “proprietário” da empresa que você está comprando ações. Pense, além da área em que atua e da sua rentabilidade, o que esta empresa tem feito para a sociedade e para o ecossistema.


No caso específico da Vale, precisamos observar a postura que a empresa tomará, entender as causas e responsabilidades, processos judiciais etc – não podemos esperar muito, uma vez que a resposta da Samarco ao desastre de Mariana foi pobríssima, irresponsável, e, se você quiser, criminosa. No curto prazo, com certeza haverá um impacto. Mas, no longo prazo, será que a empresa tomará ações para evitar novos incidentes como este? Até que ponto o dinheiro terá mais valor do que qualquer outra coisa?




Fontes: B3, Valor Econômico, Vale



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